Antes mesmo de a Bolsa abrir no Brasil, um movimento de aversão a risco já tomava conta dos mercados globais nesta segunda-feira (5). As quedas começaram nos mercados acionários asiáticos, que operavam desde o domingo, com destaque para o índice Nikkei, que registrou a maior baixa diária desde o crash de 1987.
Para Ruy Alves, a forte reprecificação pode ser explicada por um volume expressivo de desmonte de posições de carry trade sem motivo aparente. O carry trade se dá quando investidores compram ativos em mercados com juros baixos, como o Japão, para rentabilizar em outros com juros mais altos, ou até em ativos de risco.
“Muita posição de carry trade foi criada. Tinha muita coisa sendo financiada em moedas baratas. Da noite para o dia, há um choque de Var [Value at Risk, valor em risco, na tradução livre em português]”, resumiu o executivo ao InfoMoney.
Value at Risk é um indicador de risco que considera a perda máxima possível de um investimento em um determinado período de tempo e intervalo de confiança.
O movimento foi intensificado pela piora na visão de quanto os investidores poderão tomar de risco agora. “Se as correlações se quebram e a volatilidade sobe muito, eu sou forçado a reduzir posições. [Esse movimento] não parece ter correlação com fundamentos”, acrescenta.
Alves diz que é difícil dizer se a queda vista hoje é “excessiva” e que não é possível precisar se ela será passageira ou se irá se estender. “Talvez exagerada fosse a posição anterior [dos investidores] que estava muito alavancada. Agora, [a alocação] está voltando para tamanhos mais ‘naturais’ vis a vis a volatilidade”.
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A piora nas Bolsas asiáticas também levou a fortes movimentos de realização de lucro nas Bolsas americanas. Por volta das 14h15 (horário de Brasília), o índice Nasdaq apresentava queda de 2,67%, enquanto S&P e o Dow Jones recuavam 2,36% e 2,18%, respectivamente.
Oportunidades em ações
A reprecificação de ações americanas chamou a atenção de Alves para eventuais compras. “Estou buscando um caminho de volta para a Bolsa global. Abriu oportunidade. Acho que o Nasdaq caiu demais”, observou o executivo após o índice americano recuar mais de 4% pela manhã.
O profissional também diz ver assimetrias positivas em empresas ligadas a semicondutores, como Nvidia (NVDC34), Taiwan Semiconduc Manufact Co Lt Bdr (TSMC) (TSMC34) e Broadcom Inc Bdr (AVGO34).
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“As companhias estão fazendo aumento de capex [investimento]. Há uma demanda presente nesse setor”, resumiu o executivo, que também disse gostar de companhias mais ligadas ao mercado aeroespacial, como Rolls-Royce Holdings PLC, que desenvolve motores de avião.
O forte movimento de aversão ao risco também ajudou a impulsionar o VIX, conhecido como “índice do medo”, que subia quase 40% no começo da tarde de hoje, estendendo a alta vista na última sexta-feira (2) após investidores terem elevado as preocupações em torno de uma recessão nos Estados Unidos.
Recessão nos EUA? Não para a Kinea
Dentro da Kinea, porém, o cenário-base não é de recessão americana, mas sim de uma desaceleração gradual da atividade, inflação e do mercado de trabalho. Na visão de Alves, há espaço para o Federal Reserve (Fed, banco central americano) cortar os juros, mas sem necessidade de realizar reduções extraordinárias, como o mercado passou a prever nesta sessão, com agentes precificando chance de diminuição dos juros antes mesmo do encontro de setembro.
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Segundo o gestor, a economia americana deve se manter como a mais forte do mundo, e uma eventual vitória de Donald Trump na eleição americana deve ser inflacionária e reduzir a atividade e o crescimento no resto do mundo, diante da imposição de tarifas a mais produtos e países.
“Nesse sentido, é melhor aplicar [apostar no recuo] em juros fora dos Estados Unidos do que dentro. Não estamos mais aplicados [em juros] nos EUA, mas sim na Austrália, Reino Unido, e em outras geografias que, na nossa visão, ficaram com assimetrias melhores do que estavam antes”, observou.
Ao ser questionado sobre o real, Alves afirmou que o “câmbio pode fazer um caminho de volta”, ou seja, se apreciar em relação à moeda americana, passado esse momento de “choque de Var”. “Com o Fed cortando e o Brasil sendo uma das únicas geografias do mundo que tem aumento de juros precificado, acho que há espaço para o dólar ceder em relação ao real”, observou.
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O executivo também avalia que, se o Fed começar a cortar os juros em 0,50 ponto percentual e reduzir as taxas em cada uma das reuniões, não há “justificativa” para o Banco Central brasileiro elevar a Selic até o fim do ano. A casa estima que a taxa básica de juros permanecerá em 10,50% ao ano até a troca na presidência da autoridade monetária, que ocorre em dezembro, com a saída de Roberto Campos Neto.