Na última quinta-feira (25), a Enjoei (ENJU3), plataforma de vestuário de segunda mão, inaugurou a sua primeira loja física, no bairro Vila Madalena, em São Paulo. A abertura aconteceu duas semanas após a KaBum, marca de produtos de tecnologia da Magalu (MGLU3), abrir sua primeira unidade, também na capital paulista. Os casos não são isolados, nem os primeiros de comércio tradicionalmente digital buscando seu espaço nas ruas. O clube de vinhos por assinatura Wine, por exemplo, já havia feito sua empreitada em 2019. Por trás dessas movimentações, as varejistas buscam ampliar o mercado endereçável, capacidade de distribuição, conexão com clientes de nicho e ganho nas vendas por impulso.

O movimento da Enjoei não é inesperado. Em dezembro de 2023, a empresa comprou 25% (com direito a aquisição do controle) da Cresci e Perdi, uma rede de 600 lojas físicas de produtos infantis usados já mirando na expansão da presença no mundo físico. Depois da inauguração do primeiro empreendimento com a marca Enjoei na fachada, ainda devem sair duas novas lojas em 2024, para testar o modelo de negócio e expandir em franqueados.

Para a empresa, o movimento foi natural frente a um mercado crescente e altamente fragmentado de roupas de segunda mão em brechós. Em 2022, o volume de vendas nesses empreendimentos cresceu 30% frente a 2021, segundo pesquisa do Instituto de Economia Gastão Vidigal. “Houve um momento em que crescemos muito em penetração na internet. Agora, o momento é para experimentar outros canais”, diz o CEO do Grupo Enjoei, Tiê Lima. 

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Além disso, com as lojas físicas, a ideia é que clientes possam avaliar peças de segunda mão e tangibilizar o produto que consomem online, aumentando a confiança na marca e no próprio e-commerce da marca.

Visibilidade e capacidade lojística

O motivo é similar a um dos que levou a KaBum a erguer sua loja física. Trata-se de uma unidade de produtos open box, de peças compradas e, normalmente, devolvidas dentro do prazo de garantia. Segundo Bruno Chamas, head de marketing, ainda não há projeção para novas unidades. “É um experimento, um passo do KaBum. Óbvio que não muda nossa prioridade quanto ao comércio online, mas tem o fator estratégico de dar visibilidade a esses produtos. Dar mais oportunidades para o cliente que quer comprá-lo.”

Essa primeira unidade fica no segundo andar de um Magazine Luiza na Marginal Tietê, mas opera separadamente. Hoje, produtos comprados pelo e-commerce podem ser retirados em qualquer lugar da rede Magalu, o que garante à empresa uma melhor capacidade logística.

Para negócios como a Wine, unidades físicas resolvem precisamente esse problema. A empresa abriu sua primeira loja em 2019, em Belo Horizonte. Hoje são 17. Ainda que a leitura inicial pudesse levar a pensar que a pandemia prejudicaria a estratégia, ocorreu o contrário. Desde o início, a ideia foi descentralizar o estoque por meio dos pontos nas ruas. A empresa manteve o ritmo de expansão da rede durante o isolamento porque conseguiu potencializar a distribuição para atender aos pedidos de delivery.

“Queríamos que quando o assinante do clube fosse pedir um vinho, fizesse isso pelo nosso e-commerce. Mas só tínhamos um centro de distribuição, em Serra, no Espírito Santo, e vimos que os clientes queriam receber as entregas mais rápido”, explica Alexandre Magno, vice-presidente comercial do Grupo Wine. “Eles tinham a necessidade de receber o vinho no mesmo dia, porque a maior parte não se planeja para compra e não tem adegas em casa para guardar o vinho de forma condicionada”, completa.

Wine e KaBum compartilham o fato de serem modelos de comércio consumidos por clientes de nicho. Seja para testar o peso e a textura de mouses, avaliar o desempenho de hardwares ou pedir indicações e degustar vinhos, ambas viram nas lojas físicas um canal para permitir aos consumidores se reunirem. As duas empresas promovem encontros e eventos ao público nas lojas físicas e procuram por atendentes capacitados a recomendar e explicar detalhes técnicos dos produtos.

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 “As compras dentro da loja na Wine têm um ticket médio em torno de 40% maior do que as compras que pelo delivery. Nós atribuímos isso muito a experiência de ter um vendedor explicando para o cliente”, diz Magno.

Um cenário global

Embora os investimentos em digitalização na pandemia e o próprio hábito de compra tenham mudado, o comércio físico segue como o preferido dos consumidores, aponta pesquisa da PwC. De acordo com a Global Consumer Insights Pulse Survey, 43% dos consumidores seguem preferindo fazer compras em lojas —  vêm na sequência são o celular, com 34% e o computador, com 23%.

“A tendência de que os comércios nativos do mundo digital, chamados pure players, abram lojas físicas é global”, aponta Alberto Serrentino, fundador da Varese Retail. Ocorre que o custo de aquisição de clientes (CAC) nos empreendimentos físicos é menor em comparação aos investimentos em mídia e tráfego necessários no comércio online.

O pós-pandemia também tem influência nisso. Com o aumento nas taxas de juros ao redor do mundo ao fim da emergência de saúde, as plataformas digitais viram seus modelos econômicos pressionados. O equilíbrio entre o CAC e a captura desses clientes virou uma equação fundamental, explica o especialista.

“Muitos negócios digitais precisam encontrar novas formas de conquistar clientes e crescer para que os mantenha em equilíbrio”, explica. “É por isso que o e-commerce cresceu pouco nos últimos dois anos. As empresas passaram a olhar muito para margens e lucratividade nas vendas online. Diminuíram agressividade comercial, descontos, parcelamentos sem juros. Tudo isso afeta a demanda”, completa.

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