Os franceses vão às urnas novamente neste domingo para o segundo turno das eleições parlamentares, numa disputa que marca o momento de maior popularidade do partido de extrema-direita Reunião Nacional (RN) em sua história.

Ainda que as preferências de grande parte do eleitorado pelo discurso nacionalista e populista estejam se mostrando parte de um movimento global, a ascensão em particular na França está muito ligada à repaginada que Marine Le Pen deu à sua agremiação nos últimos 15 anos.

A política atenuou seu discurso anti-UE, se afastou do antissemitismo do pai e ex-mentor, focou em problemas do dia a dia dos franceses – cada vez mais irritados com seu governo – e tem conseguido capturar o sentimento de raiva e frustração da população. Além de não perder uma oportunidade de mostrar seus gatos e frequentemente citar seu amor por eles.

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O Reunião Nacional é a denominação atual do antigo Frente Nacional, partido de posições extremistas que foi comandado pelo pai de Marine, Jean-Marie Le Pen, político famoso por declarações xenófobas antissemitas e que foi candidato à presidência da França em cinco oportunidades.

Marine é advogada de formação e foi vista durante muito tempo apenas como apenas uma versão feminina e mais jovem do pai, adotando um tom beligerante contra imigrantes, especialmente os de religião muçulmana.

Isso mudou conforme ele foi crescendo dentro da estrutura do partido, até conquistar sua direção em 2011. Em 2015, em meio a um debate público sobre o tom moderado do discurso, ela conseguiu afastar o pai da legenda, no que foi considerado um ponto de virada para um RN mais palatável à opinião pública. Na época, Marine declarou que não teve escolha. “Era isso ou o movimento desaparecia”, disse numa entrevista.

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“Desdemonização”

O partido como um todo adotou uma estratégia que os especialistas políticos classificaram como de “desdemonização”, abraçando nacionalismo, por exemplo, sem pregar mais uma saída do país da União Europeia. Uma figura muito explorada pelo partido é do santa Joana d’Arc.

O passado antissemita aparentemente foi sepultado no final do ano passado, quando Marine Le Pen marchou ao lado de judeus numa manifestação contra os ataques terroristas promovidos pelo Hamas contra Israel. Mas o discurso e o programa partidário contra os imigrantes e contra a globalização permaneceu intocado.

Um estudo da Fundação Jean-Jaurès, ligada ao Partido Socialista, disse que “a comunicação do RN se tornou mais flexível”, porém as posições seguem sendo “radicais”, sobretudo no que se refere à imigração e a questões culturais. Um exemplo é a reivindicação de Le Pen de que se proíba no país o uso do lenço de cabeça islâmico.

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Nas apresentações públicas e entrevistas, a líder ultradireitista busca se concentrar em questões sociais, atacando propostas de mudanças na previdência, de cortes em auxílios para estudantes e famílias pobres e na preservação do poder aquisitivo. O RN é amplamente favorável a reduções de impostos.

Amor aos gatos

Marine também tomou o cuidado de se mostrar mais aberta e ponderada nas aparições públicas. Mudou o corte de cabelo e o tom de voz e costuma se referir com frequência ao amor que sente por seus gatos de Bengala.

Ela já contou em entrevistas que foi a morte de seu pet Ártemis por um cão doberman de seu pai que a fez decidir mudar de casa, em 2014, exatamente no momento em que as divergências entre os dois tinham ficado mais fortes.

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A mudança de imagem tanto do partido como de sua líder e porta-voz tem surtido efeito. A última pesquisa “Fraturas Francesas”, feita anualmente pela Ipsos em parceria com a Sopra Steria, mostrou que as forças da direita estão conseguindo avançar em meio a um sentimento de raiva nas diferentes categorias da população.

A visão anti-establishment tinha o apoio de 45% dos franceses em 2023, 9 ponto acima do percentual captado no ano anterior.  O sentimento de uma França em declínio também está aumentando (82%, +7 pontos).

Enquanto isso, o Reunião Nacional de Marine Le Pen vê a sua imagem em melhora constante, com todos os adjetivos positivos subindo: 44% dos franceses têm a sensação de que o RN seria capaz de governar o país (+5 pontos).

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Por outro lado, as imagens negativas associadas ao partido recuaram novamente: 66% dos franceses consideram este partido de extrema-direita (-4 pontos) e 52% consideram que é perigoso para a democracia (-2 pontos). Por comparação, o França Insubmissa, legenda de esquerda comandada por Jean-Luc Mélenchon, é hoje considerada um partido perigoso para a democracia do que o RN (57% contra 52%).